quinta-feira, dezembro 29, 2005

o meu caderno novo

Temos um ano aí à porta, novinho, por encetar. Recordo que nos tempos de escola, adorava começar cadernos. Enfeitava com esmero as primeiras páginas. Sublinhava a palavra "sumário" com dois traços a tinta vermelha e separava os itens com pontos gorduchos a verde. Páginas depois, instalava-se o caos da pressa e da preguiça. A letra tornava-se maior e mais descuidada. Abundavam as abreviaturas e as rasuras. Os sublinhados iam a azul, o mesmo tom uniforme da escrita apressada. Pareciam duas pessoas distintas que tomavam posse sucessiva daquele caderno. O brio e o desleixo. Percebo agora que vamos fazendo o mesmo com tanta coisa na nossa vida. Vamos deixando de sublinhar o que verdadeiramente importa e vamos descurando a estética das coisas, das relações, até elas se tornarem monocromáticas, desinteressantes, feias e banais.
Este ano, tentarei enfeitar o meu caderno da primeira à última página. Embelezar a essência da matéria dada com pequenos retoques. Apreciar o volume de páginas em branco e acreditar que as preencherei de úteis apontamentos com aprimorados sublinhados multicolores. Quando chegar à altura de folhear a última página quero estar ciente deste meu esforço e fechar-lhe orgulhosa a sua contracapa.

terça-feira, dezembro 27, 2005

o que não muda

Tenho esta beligerância nas palavras e um tom agreste na voz. As convenções, de tantas raízes, confundem-se com as convicções. Sinto a irritação crescer e contagiar-me como vírus perigoso em progressão geométrica. Calo-me. Talvez tarde demais.
O corpo já feito cadáver, ausente de vida. Enxameiam-se as pessoas ao seu redor. Os cortejos fúnebres acompanham o morto e não quem sofre a sua ausência. É em vida que se sente a dor e a saudade, contudo, é o corpo que não pode ir sozinho no carro preto com rendas e flores. Percebo as lágrimas de quem amou e o vazio que fica. Vazio que, sei-o, não se preenche com torrões de terra ou pedras inscritas. Porque estão lá os que antes não estavam? Porque se junta ao caixão quem não se junta no Natal? Porque se guardam urnas com cinzas? Que amor perdura por uma caixa de madeira com o pó de restos cremados? É difícil amar o invisível. O grande desafio que Deus terá perdido para as imagens e símbolos. "Que linda cerimónia"! O carro não pode parar na estação de serviço, para que quem conduz sacie a fome, beba um café, faça um xixi. As funções vitais ofendem quem jaz sem elas. Repara nos pormenores quem o sofrimento não tolda a percepção. Flores, muitas flores de cheiro enjoativo para quem não as recebeu pelo último aniversário.
Não há olhos postos no azul. Ninguém vê o céu. Todos veêm o preto. O luto pesado que enfeita e adelgaça as mulheres misteriosas por detrás dos óculos escuros. Reza-se por quem não foi à missa. É assim. Eu sei que é assim. E ainda assim, calo-me sempre tarde demais.

quinta-feira, dezembro 22, 2005

espíritos



Se o Natal é quando a gente quer, eu cá não quero, portanto não mo impinjam!!!

terça-feira, dezembro 20, 2005

chamassem-me ainda mulher

Desta imagem do Revelações surgiu o desafio das Palavras em Linha:
Tenho nos olhos a ironia do que fui e ninguém sabe ou lembra. Tenho por vezes a tristeza desse esquecimento. Sei que este velho invólucro não ajuda à memória ou ao amor dos outros e, por isso, vivo sobretudo de recordações. Sinto o mundo da mesma maneira, o pulsar da terra e a diferença de um dia a mais. Tenho a vontade de gritar que ainda sou a mesma mas a certeza da estranheza desse grito. Porque somos sempre os mesmos. Iguais. A mesma essência numa matéria que se faz em brancos, dores e rugas. Esperei anos em vão pela suposta transformação. A que faria de mim alguém mais próximo do meu corpo. A que me transformaria na consciência da minha idade. E como é cruel ver-me como vi outros em outros tempos, quando então passava lesta e indiferente ao futuro. Quando o futuro nos chega às mãos e ao rosto apanha-nos desprevenidos. Porque somos a criança vestida de anos. Esperava eu que pudesse ser de outra forma. Que houvesse um lento descarregar das baterias da vida e da vontade para que me fosse indiferente o lugar que me cedem ou a beata compaixão que me concedem. Queria então justificar o jovem orgulho que me resta, sem o patético desprendimento que finjo. Ou que por milagre me vissem por dentro, para que lessem a origem desta arrogante agressividade. Põe-me nas mãos o caldo, a sopa que me alimenta a persistência mas que não me dá forças para me por fim. Pussessem-me na boca um beijo e escolhas nos dedos, chamassem-me ainda mulher e eu entenderia a roupagem deste meu destino.

quinta-feira, dezembro 15, 2005

conto de Natal

Quebraram-se os ramos da última árvore e com eles a canção de Natal de algumas crianças. Tentaram colá-los ao tronco como se este, apesar da sua vontade, os pudesse aceitar de volta. Mas não havia vontade que chegasse para consertar a morte. E no chão, duas folhas de cores berrantes, assinalavam a maldade gratuita, aquela que é feita a troco de soldo nenhum. Já se via a seiva feita sangue e os galhos como cadáveres, que o sentimento tem destas metamorfoses quando deseja aprofundar a dor no coração, para que esta marque e doa. O que dói deixa marcas de ensinamento muito para além de qualquer convalescença. As crianças olhavam a árvore compreendendo todos os homens - os que cultivam e os que matam. A árvore balouçava ao vento o pouco que lhe sobrava da sua dignidade antiga. Ali mesmo se fizeram solidárias as mãos dos meninos e das meninas, dando descanso na terra aos pequenos troncos e afagos à mãe amputada. Pudesse a árvore ter-lhes dito o que sabia e teria sido maior a lição. Na noite de Natal eram as folhas de cores alegres que enfeitavam as casas, simbolizando o respeito pelo que sobrara. Houve uma estrela mais brilhante que acomodou a sua luz no topo da última árvore e talvez por isso se desse o milagre muito antes da Primavera. Foi por Janeiro que as crianças voltaram e agradeceram à vida ter ressurgido do nada, ali onde a mesma árvore se rodeara de irmãs, acreditaram que Deus ainda tinha poder sobre o mal.

quarta-feira, dezembro 14, 2005

dívidas de amor

Subo a escada e paro a meio. Precisamente a meio caminho entre a subida e a descida. Entre a casa e a rua. Entre ti e outro. Sento-me nos degraus e tento descobrir o que quero. Tento saber o que não quero. E não quero a dor nem a solidão mas também quero o que me falta. A paixão, a intensidade, a liberdade de correr pelos passeios e a expectativa de te encontrar numa qualquer esquina. Não quero olhar para baixo nem quero galgar o que me separa da tua porta. Não gostaria de te ver chorar mas tenho saudade do meu riso. Não me quero ver chorar mas gostaria de te fazer feliz. Escondo a face entre os joelhos e aperto com as mãos os tornozelos. Continuo sentada no degrau até este me gelar o corpo e solidificar uma qualquer escolha. E tu desces a escada e pegas-me na mão. Passas os teus dedos entre os meus cabelos. Ajeitas a minha boca para um beijo quente e dizes que me adoras. E eu espreito por cima do teu ombro desejando que alguém suba a escada e me dispute. Mas ninguém aparece. Estás tu comigo. Como sempre estiveste. Penso que te devo mais do que uma dívida. Penso que te devo o amor que tu me tens. Sei que o amor não se deve e que o meu está emprestado a juros. Transportas-me para a casa e fechas a porta. Olhas-me e pedes-me só que eu te deixe ter-me e eu digo-te que já me tens.

segunda-feira, dezembro 12, 2005

sobre a natureza

Conheço os segundos que antecedem a tempestade. O silêncio carregado de energia e de mensagens e a ansiedade dos olhos postos no céu, aguardando o desabar dos acontecimentos. E prefiro o ribombar do primeiro trovão, que corajoso se anuncia em força e que deixa adivinhar a brutal sequência, à ignorância inquieta da negritude carregada e muda. E assim prefiro quase tudo na vida. O que se expõe ao que se esconde. O que avança ao que recua. O que luta ao que se acobarda. A acção à expectativa. Prefiro a tempestade ao seu anúncio. O que explode ao que interiormente se consome. Que é maior a violência do que se arrasta na sombra do que a luz que de sopetão nos cega. Gosto do que se mostra. Da frontalidade da chuva e das torrentes soltas das palavras, do barulho das vozes iradas aos cínicos e encolhidos sussurros dos moles aguaceiros. Na natureza das coisas e dos homens prefiro a festa ao seu convite.

sexta-feira, dezembro 09, 2005

certezas absolutas

Bem sei que prometi amar-te para sempre mas a eternidade terminou, sei-o agora. E não falo da relatividade do tempo mas do absolutismo das emoções. Como são eternas as noites de Verão enquanto sentimos o seu calor fazer-nos transpirar de certezas e é esta a eternidade que conheço. Ou como a outra estação, a que refresca lentamente logo após, nos traz a clarividência da absoluta necessidade dos agasalhos. Amei-te absoluta, total e eternamente. E isto sei-o também agora. Mas as estações retornam. Sei lá eu mais o que retorna. Tornará porventura uma outra eternidade? Voltarei eu ao princípio de todas as coisas? Que princípio ou que fim damos ao que eternamente retorna? Mas agora terminou este tempo com estas novas certezas. Como prometer se não há eternidade que a de uma quente noite de Verão ou a do refrescar de uma tarde outonal? Bem sei que pouco sei para lá do que sinto, mas de resto, o que existe para lá do que sentimos? Ou ao menos, o que me importará a infinitude se não a conheço? De que me serve a extensão do Universo senão para justificar a pequenez das minhas promessas e para tornar menos espessas as minhas certezas. Amei-te para sempre e talvez volte a amar-te para sempre. Talvez volte a prometer-te toda a minha eternidade. Não tenho ainda essa absoluta certeza.

segunda-feira, dezembro 05, 2005

façam vocês também

My Bloody Valentine
You Are...My Bloody Valentine.

You tend to be a bit distant and reclusive. You are
a leader as opposed to being a follower. You
are a perfectionist and pay very close
attention to detail. You have the tendency to
be lazy, which sometimes get's in the way of
you achieving whatever it is you may be trying
to perfect. You don't really care about what's
typically looked upon as the norm. You really
don't care about what people think about you at
all, or at least so you try and make it seem.
You care most about just being yourself.


what Creation Records band are you? (complete with text and images)
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