segunda-feira, março 17, 2008

monólogo

Claro... de entre todos, de todos sem excepção, a tua devoção é a mais sincera e a promessa dos teus beijos a mais cálida e agitadora.
Mas que queres?, se o silêncio me empurra até ao fundo do meu passado para que o enterre eficaz e terminantemente. Não, não creio que seja mentira. Talvez uma omissão, uma desculpa, a piedade. Se tu, que praticamente só me adivinhas, descobres a verdade no meu hálito, que direi eu a mim própria para me negar ou mesmo convencer?
Não lamentes nunca o acesso que te nego à minha torre. Pois se é a tua sorte. A chave, transviada nas mãos de um outro louco, evita-me a loucura. Seria eu, não vês?, culpando-te a ti, aos outros e ao mundo do que jamais lograrei esquecer.

ao pôr do dia

Não faço sequer a diferença. A estrada, que em socalcos desvia num beco, não traz surpresas. Abandonei as mãos ao vento e a sombra, à sombra maior das arcadas. Os bolsos virei-os de banda, ao avesso, para que não percam tempo a pedir-me o que não tenho. Enfiei o rosto abaixo da linha cómoda dos ombros como se houvesse algo a temer - mas nada! - nem sequer os incómodos de uma estrada que termina abruptamente. Quando fixar a parede suja, altiva, viro-me conformada para trás. Não se hão-de ver tijolos vermelhos e velhos nos meus olhos. Talvez o pó na ganga coçada pelo uso de anos ou os rasgões propositados nos meus sentimentos. Escolhemos estas coisas. Eu?, eu não faço sequer a diferença de deixar esbater o meu corpo na poeira do caminho. E as mãos com as palmas amplas e abertas a arranhar os interstícios de uma parede de tijolo. E agora já não sei o caminho de regresso pela estrada das arcadas sem luz...

quinta-feira, março 13, 2008

o amor

Voltou três, quatro vezes ao coração dele. De todas lhe disse a verdade: amava-o o melhor que sabia. E uma vida inteira ensinara-a a saber quase tudo sobre o amor - nobre e democrático sentimento de amiúde confundido com a posse - o suficiente para saber que era desprendimento, dádiva, contemplação. Por ali ficara a olhar o seu amor, a desejar-lhe os mais íntimos e suaves contornos até ao limite da fé no não retorno. Quando quase vencida partia por algum tempo. Regressou três, quatro vezes ao coração dele. Com a verdade nos olhos: amo-te! amo-te! Quase gritando: não me ouves?
De que lhe adiantava que a ouvisse?! Até perceber que o amor não precisa de retorno. Uma vida inteira para aprender uma simples lição: O amor não é feliz, é só perfeito.