sexta-feira, novembro 17, 2006

inventando um inverno de avó

Vou dedalando bainhas em pontos e alinhavos de sonho como gotas de chuva em sombrinhas descaradas e pasmo com os pequenos sorrisos debruados nas linhas do meu rosto reforçadas pelos muitos anos.
Olho o calendário dos dias que esvoaçam das suas casinhas quadriculadas, paralelas, e perco os olhos na imobilidade do ar, vendo o sentido da vida a desenhar-se como um horizonte cerzido num pano.
Escondo a luz de muitas auras repetidas e penso que a vida não tem idade porque as horas passam de fininho até darem fé da hora do lanche. Há uma paz na chuvinha tão miúda e pequena que desenha ribeirinhos nas vidraças, o cheiro do chá e das torradas a bailar nos azulejos e o forno com entrançados biscoitos de manteiga. Há uma história de uma casa imaginária onde é bom haver notícias de um jornal, risos entretidos de criança, com cacau, bolachinhas e doce de morango.
Há um acolhimento milenar muito próprio do Inverno, uma fome de um lar com gente e fogo quente na lareira e as cortinas nas janelas de madeira onde espreita todo o tempo conhecido. Há uma família entre as linhas dos meus dedos e desejos que se junta em ceias e serões de luzes amarelas, multiplicando os meus silêncios em músicas de Natal e gargalhadas, atropelando de gente e gatos o corredor vazio.
Vou fazendo costuras de estações e arremates de palavras unindo um futuro copiado de um passado, numa renda de avós e netos debruçados em afagos e bonecas penteadas.

"costuras de estações" foi roubado - com autorização - ao meu amigo Batista

6 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Gostei do ponto.
A dar tanto ponto não se sente a bolha?
Bfs, bvjs

12:43 da manhã  
Blogger batista filho said...

Nessa quase madrugada, passo só para desejar que tua noite seja de Luz e refazimento. # Quanto ao post... embalado por sentimentos tão bem retratados, repousarei, para que logo mais possa melhor percebê-lo. # Deixo o meu abraço fraterno, Amiga querida.

1:35 da manhã  
Blogger Bastet said...

a dar pontos constróiem-se outras bolhas irreais onde cabem tempos também imaginários como este do tempo de ser avó! :)*

batista: :)***

10:21 da manhã  
Blogger batista filho said...

É um dos textos mais belos que li nos últimos tempos. Quanto a ser “imaginário”, tiveste que vivê-lo; no mínimo, introjetá-lo: caso contrário não conseguirias passar com tanta fidedignidade e força de expressão tal gama de sentimentos.
Senti uma grande identificação, inclusive com a proposta inicial do meu próprio blog: que é de preservar a memória das pessoas do lugar... e por falar nisso... rss... gostei, mas gostei tanto que ouso pedir... Amiga, um pouquinho mais pra frente poderia eu publicá-lo aqui nessa “ilha...”?
Um abraço fraterno.

8:59 da tarde  
Blogger Bastet said...

Batista, deste blog retiras o que quiseres e quando quiseres. Considera esta autorização com carácter vitalício. :)***

10:28 da manhã  
Blogger batista filho said...

rss... + rss... de pura alegria e agradecimento, amiga. que o teu dia, ao lado de tua filhinha, seja maravilhoso!

10:34 da manhã  

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