sexta-feira, setembro 29, 2006

acto de contrição

Não deveria ser este o sítio mas não tenho outro melhor. Toda a minha vida militei de ideias das quais hoje me arrependo pelas provas mais que concretas de que não funcionam. Vi mal. Ajuizei mal. Mea Culpa. Contribuí com o meu voto durante todos estes anos para o estado em que o País se encontra. Afigura-me agora muito claro que as políticas económicas e sociais (quais?) praticadas, só contribuíram para a miséria de muitos e para o fausto de uns poucos que, apesar de técnica e humanamente incompetentes, se vão mantendo mais do que à tona, numa teia de corrupção vergonhosa, castigando sempre a mesma massa de gente que, por pagar prontamente os seus impostos, continua com o seu cada vez maior sacrifício a alimentar este País.
Mais grave ainda é que, constatada a desgraça, se pretenda remediá-la com mais do mesmo: aumentar e fazer grassar a insegurança, tirando aos trabalhadores a sã expectativa de poderem continuar a alimentar-se a si e às suas famílias, submetendo-os à moderna escravatura do trabalho precário, à subserviência de abanarem com a cabecinha a tudo, apenas por medo, apenas por necessidade.
Provam várias teorias sociológicas que só quando o homem tem as suas necessidades mais básicas asseguradas, se pode preocupar com o seu enriquecimento enquanto ser humano, com a sua auto-formação e com o brio profissional que decorre de uma entrega satisfatória e satisfeita a uma causa, a um trabalho, a uma instituição.
Não é isto a que assistimos. As medidas que se avizinham não falam de uma maior e mais séria fiscalização aos múltiplos processos de corrupção que todos conhecemos, ou sequer do corte de regalias à corja que administra este País. Não se fala da necessidade de requisitos mínimos para ingressar como administrador num qualquer serviço público, os fantásticos cargos políticos que acolhem os anormais estupidamente bem pagos, sem outro rasteio que o famoso processo eleitoral democrático. Depois dos anormais, vêm os assessores dos anormais, igualmente pagos de forma principesca e transportados com graça mas não de graça nas limousines oficiais.
Este processo vivemo-lo diariamente, conhecemo-lo de ginjeira, e não logramos sequer poder denunciá-lo porque já é público. De resto, toda e qualquer tentativa de fazer diferente é imediatamente cortada pela raiz pelos múltiplos sistemas de alarme dos bufos existentes, colocados ao correr da pirâmide, e que garantem que as personae non gratas são afastadas, caladas, emprateleiradas e desacreditadas.
Continua-se a pretender penalizar a função pública na lógica anciã de retirar o que está bem feito para nivelar por baixo. Continua a pretender-se deixar entregue à cega lei do mercado sectores fundamentais como a educação e a saúde, garantes de um mínimo de igualdade e de dignidade entre os seres humanos. Continuamos a pautar a sobrevivência do homem pela lei do mais forte, quando o nosso avanço espiritual já nos deveria de permitir e mesmo obrigar a ver mais longe, a afastarmo-nos um pouco mais da lei da selva.
Se querem racionalizar os recursos humanos existentes, fiscalizem ainda melhor os processos de recrutamento, deixando de permitir que os políticos que não são recrutados metam as suas cunhas aos técnicos, sob ameaça de lhes retirarem os cargos de chefia conseguidos com mérito e trabalho. Se querem aumentar a produtividade, invistam na qualidade das condições de trabalho, na criação de meios que permitam aos trabalhadores focarem-se, sem o receio pelos filhos que não têm segurança nas escolas, sem o stress de não saberem se podem continuar a pagar o empréstimo da casa.
Porque nunca é tarde para arrepiarmos caminho, fica aqui o meu público acto de contrição (para satisfação de poucos e horror de muitos) e a declaração solene de que a partir deste momento me considero uma mulher de esquerda.

14 Comments:

Blogger Alcabrozes said...

FINALMENTE!
AVANTE CAMARADA, AVANTE!

12:51 da tarde  
Blogger Erecteu said...

Com essa decisão és uma mulher d'armas.
Olha considera-te minha protegida.
Se me quizerem fazer mal posso correr para ti?

Um incondicional beijinho, minha fofa de esquerda

2:08 da tarde  
Blogger Bastet said...

Pois é Pedro A. muitos viram antes de mim... até a bussola, lembras-te?

Erecteu: é sempre bom ter um protector e por mim podes correr para cá quando precisares, cá estarei armada para o que der e vier! :)*

2:41 da tarde  
Blogger shark said...

Viste a luz. Mas olha que a mim nunca enganaste, topa-se logo a esquerdalha dentro de cada um nós. :)
Belo texto, cheira a Revolução.

12:39 da tarde  
Blogger batista filho said...

... inda comentarei esse texto, meu amiga querida.

3:11 da manhã  
Blogger batista filho said...

errata: minha amiga querida.

3:12 da manhã  
Blogger Boabdil said...

Concordo em tudo o que escreveste. Só me pergunto se fara assim tanta diferenca ter um governo mais de esquerda? Se bem lembro, quando o nosso querido Guterres foi chefe de governo promoveu várias medidas de esquerda. O resultado? caos! A reforma educativa, por exemplo, quase que impede os professores de reprovarem alunos, logo, estes "aterram" no quinto e sextos anos sem saber ler. Isto para nao falar que BE é uma amálgama de partidos sem um programa económico viável (eu cheguei a votar no extinto PSR do Louca, nao sou um Facho) e o PCP está longe de ser um Partido Democrático per se, embora tenha feito mais pelo derrube do estado novo que qualquer outro partido. Poderia falar do despotismo do cavaco, do santana nao é preciso falar, e o PP do Portas... a palavra que me bem á cabeca é nojo! Conclusao... nao é uma questao de esquerda ou direita, ou sequer de partidos. O problema é mesmo das pessoas incompetentes que gerem os destinos desses partidos (eu diria que ainda pior que os lideres sao aqueles que manobram nas sombras, esses nunca pagam realmente pelo que fazem)

1:33 da tarde  
Blogger vague said...

Ai mulher!

Este país realmente só pode melhorar e se calhar se entrasse hoje por esta porta um governo de esquerda até podia ter sorte,

mas não me convencem os lugares por esse mundo por onde já passaram os de esquerda todo o teor do seu discurso, que, teórico, é realmente muito bonito.

e que me desculpem os muitos de de esquerda mas é o que eu penso mesmo, por isso,
nem tenho nada q pedir desculpa :)


[private: menina bastet tu tens tempo, não te apresses, que se esgotarem os ditos, sempre temos o Porto ou uma cidade qualquer do mundo e aí vamos atrás deles em tournée; gr, mulheres de esquerda :p ]

6:19 da tarde  
Blogger vague said...

Esclarecimento e adenda.

"mas não me convencem os lugares por esse mundo por onde já passaram os de esquerda e todo o teor do seu discurso, que, teórico, é realmente muito bonito, mas só aí no plano dos princípios. Não me identifico com o 'projecto'. E aí, no plano dos princípios, sinto-me até mais de esquerda que muitos de esquerda deluxe ou da esquerda avante e é mesmo por isso que não milito aí
Princípios e prática, teoria praticada".

Agora é que já está!

:)

6:26 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Ena!
Bem vinda ao barco.
Mas olha que há muita esquerda por aí...e há só uma única que aplica as teorias.
Não sei bem como é que alguém pode classificar o Guterres "de esquerda", por exemplo. Já para nem falr do Sócrates.

9:13 da tarde  
Blogger Aires Montenegro said...

Bravo pelo texto - forma e conteúdo!!!
Entendo esse ser de esquerda com a carga romântica, revolucionária e pura dos anos 60, e cuja chama continua a brilhar-me no peito com orgulho e apenas com uma diferença: hoje não acredito em nenhum partido!!!
Este texto merecia uma divulgação além-blog!
Bjs e abraço (que em mim continua revolucionário, embora não saiba bem para que possa servir além de me manter vivo...) E força, mantém viva essa força. Sofrerás mais, mas não te trairás! Os meus 58 anos têm-mo ensinado. Outro abraço!!!

10:25 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

oh bigodes então tu precisas de te assumires de um ponto para saberes o que está errado desde o inicio?
quem pensa nos actos pode e deve estar sintonizado com todos os "angulos", de forma a não deixar que as palas o estorvem.
mas acho bem
avante
:-)**

8:58 da manhã  
Blogger . said...

Ah!Ah!Ah!Ah!Ah!Ah!Ah!Ah!Ah!Ah!
AR

2:11 da tarde  
Blogger aDesenhar said...

"acto de contrição"... vale mais tarde que nunca.

concordo contigo.
Paira no ar um certo cheirinho a Revolução...

Mama Sumae

:-)

1:58 da manhã  

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