este meu filho
Qual é a evidência de uma realidade que não me serve? Onde guardo a esperança perante a nudez dos factos? Procurem no chão pelos meus pés e na avenida pelo meu sonho. Saiu de mim solitário e fez-se à estrada. Esporadicamente pousa nesta terra quando frágil. Retempera-se e foge depois. Alguém tem que ficar por aqui. A quem volta um sonho cansado? Sou a mãe deste filho imaginário. Já me dói a sua dor mas não evito reanimá-lo. Cheguei a dizer-lhe que não valia a pena mas olhou-me destroçado. Porque corre uma quimera? Quando olho o que me fica, conheço melhor a verdade. Ou talvez seja a sua ausência que me cristaliza. Chegámos a jurar juntos uma derradeira viagem enquanto lhe afagava os cabelos de vento e lhe punha um beijo no voo. Era a última aposta e saiu fracassada. Temos que tentar outra vez ! – Que mais pode um corpo dizer ao seu sonho? E ele assentiu. É da sua essência ser assim. Não lhe chamaria força nem coragem. Poderia ser desespero, mas não o é. E não é muitas outras coisas. É o que é – um sonho. Quando dou por mim sem ele fico mais lúcida e, ele que me perdoe, quase desejo que não volte mas à medida que o vazio se instala, tão sórdido, tão frio, percebo que estou incompleta e vou à varanda esperar o seu regresso. Sei o que ele me faz. Que me empurra o dorso para a frente e me enche o peito de ar. Traz-me um espelho que me faz diferente. Erguem-se-me os pés das ruelas e calcorrilho pontões à beira mar. É com ele que me sento a ver o por do sol e sobretudo as madrugadas. Sussurra-me baixinho as alegrias vindouras e eu, comovida, acredito que não me mente. E nele não há mentira. Aprendi a diferença entre o falso e a fantasia quando perlava de lágrimas o meu desencanto e lhe adivinhava uma ferida maior. Mortifica-me quando me falha mas sei lá eu viver sem ele? Pode lá uma mãe viver sem o seu filho? Sei que voltará constantemente à minha casa a anunciar-me a Primavera até ao dia em que o Inverno seja maior e a lei da natureza o arranque do meu sopro.
6 Comments:
Os sonhos temperam a vida, não achas? E são uma boa meta para procurarmos alcançar; ou apenas para sorrir e sonhar.
Beijo cheio de saudades.
São sim Zu e calcula tu que já vou tendo o snho de te voltar a pôr a vista em cima! Um beijo muito grande para ti e outro para a Miósotis.
mau, que história é essa do espelho?
o teu armário só tem trapos inconscientes ;-)
"Onde guardo a esperança perante a nudez dos factos?"
Amiga, o ideal mesmo é não guardá-la: é deixá-la escorrer pelos poros, para que façamos frente "à nudez dos factos",às vicissitudes cotidianas...
Pra lá do comentário acima, estás cada vez mais afiada com as palavras!!!
Nem só JP mas tem muitos :)
Obrigada Batista, por cá vou amolando as palavras para que se aguçem no papel :)*
"Uma Mãe viver sem o seu filho, não é viver.....
bj
Pedro
Enviar um comentário
<< Home