domingo, julho 25, 2004

uma carta escrita

Sabes, para a semana vou de férias. Estou dividida entre este espaço que pouco habito diariamente e outro que supostamente me fará descansar. Estou dividida entre o que levo e o que fica. Fazer opções, definir prioridades, simplificar, o processo anual da gestão do tempo e do dinheiro que se repete agora no fazer das malas. Queria levar algum passado comigo e pouco ou nenhum presente. Queria levar as roupas dos meus vinte anos e o corpo que as usava, queria levar os meus pais e irmãos para que tomassem conta de mim e brincassem comigo. Mas não. Levo-me a mim e levo a minha filha.
Perguntas-te a esta hora porque te escrevo. O porquê de uma carta tradicional, com envelope, selo de correios e tudo. Olha, dei-me conta que à porta do meu prédio tenho um receptáculo de contas, da luz, da água e do telefone. Já não tenho uma caixinha mágica com uma chave pequenina e engraçada que guardava cartas de amor e amigos. Lembrei-me dos envelopes obesos que a minha prima Armanda me mandava, com fotografias de revista e novidades de namoricos em festas de garagem. Lembrei-me das cartas do namorado que estudava em Coimbra, depois do outro que estudava no Porto. Creio que namorava com eles porque era por carta. Essas cartas que eu guardava debaixo do papel que forrava a gaveta da roupa interior e que pela noite, depois do pai se deitar, lia e relia para me alimentarem os sonhos.
É por isto que te escrevo, porque o tempo de escrever me parece esquecido, porque o tempo em que se trocavam cartas me parece distante e doce. Escrevo-te minha amiga para te dizer que tenho saudades, saudades tuas e minhas. Saudades.